Ricardo Lubisco
CADELA DESALMADA
CONTOS poemas DEVANEIOS comentários PALAVRAS SEM SENTIDO
quarta-feira, 5 de agosto de 2015
mitos e realidades paralelas
Ricardo Lubisco
terça-feira, 31 de julho de 2012
C.P.
quinta-feira, 28 de abril de 2011
Salmo
O certo é que prezamos a destruição.
Qualquer coisa chegando ao fim, eis o que nos interessa.
Fotografamos ruínas e colecionamos imagens de casas enfermas, desenganadas pelo tempo,
e apreciamos o turismo por vilarejos decadentes,
prestes a sumir do mapa.
A imagem do velho edifício implodido nos mantêm cativos
diante da tv.
O que move a ferrugem não é mistério para nós:
conhecemos essa fome - e a respeitamos.
A árvore doente do passeio público nos interessa
mais do que as crianças desaparecidas.
Comovidos, chegamos a abraçar a velha figueira ameaçada,
pretextando solidariedade.
Mas não somos solidários, não se engane.
Apenas queremos estar por perto na hora final.
O certo é que apreciamos a destruição.
Casais nos falam de crises, da reta final, da beira do precipício.
Ouvimos interessados os pormenores da autópsia conjugal,
queremos saber em que momento,
as vísceras do encanto deixaram de cumprir seu papel,
queremos conhecer tudo que fez do desejo
azinhavre, mancha agônica, bolor.
Existe desamparo maior do que
num velho carro entregue ao pó junto ao meio-fio?
O disco riscado e o livro que perdeu folhas e palavras
são nossos entes queridos.
O amigo que faz aniversário recebe nossos cumprimentos,
pois deu um passo à frente, rumo ao fim.
Vamos a velórios de parentes e conhecidos
com um olho vermelho de consolo, o outro verde de curiosidade:
quem visitaremos inerte da próxima vez?
Amamos o corroído (pontes, trens, viadutos),
o que está prestes a se perder.
Respeitamos os desgastado, o roto,
o que se esfarelou, majestoso.
E esperamos.
Porque algo foi posto em marcha,
está a caminho.
sábado, 22 de janeiro de 2011
2011
Sob histórica enxurrada de informações
Vemos a morte desmoronar
sobre os telhados da razão
Inundar as arestas dos corações espalhados
sobre um corpo instável e esfarelento
Tudo esfarela-se umidamente
Discutem sobre imprudência e fatalidade
Alguns celebram a vida face à morte
furtam pequenos “futuros da nação”
desse violento Rio de sangue recém formado
Que desce
e desce
Onde cardumes de pessoas bóiam e afundam
num [Rio de sangue em
Janeiro]
(...)
Outros boiam e afundam
em telefonemas e torpedos
Em frente à televisão
Nosso Grande Irmão está de aniversário
Décimo primeiro aniversário
Um carismático intelectualóide com seu filtro solar
dispara frases “rarefeitas”
Que tocam os corações dos irmãozinhos
Confinados sob um olhar “Orwelliano”
Discutem sobre líder e eliminação
à luz da afinidade
Sob histórica enxurrada de informações
A audiência se divide
[Comovida]
Entre irmãozinhos confinados
E corpos úmidos desabrigados
Christian Pizzolatto
terça-feira, 19 de outubro de 2010
Batom vermelho
A marca do amor comprado
nas seções de jornais
O batom vermelho tinge
o ímpeto animal,
sacia
Tece as horas
Nos corpos dominicais
Christian Pizzolatto
sexta-feira, 10 de setembro de 2010
CROAC
Acordo com as roupas bagunçadas. Sinto um perfume conhecido. Inalo o máximo que consigo. Ela esteve aqui. Passou a noite comigo. Eu sei. Tento abrir o zíper da barraca. Não consigo. O perfume me enlouquece. Eu continuo tentando inalar o máximo que posso. Sinto o espaço na barraca diminuir. Ouço vozes do lado de fora. O perfume ri de mim. Eu já não tenho mais espaço. A lona da barraca me espreme. Mal consigo respirar. A risada fica mais forte. Ensurdecedora. E continua a gargalhar enquanto a barraca me engole. Eu mergulho profundamente nas minhas lembranças e não encontro ninguém. Não acordo mais do meu sonho.
O silêncio impera no ambiente, a não ser pelo barulho de um sapo e da barraca fazendo a digestão.